Cinema
Por Juliana Varella

Praia do Futuro: não é fácil ser herói

Wagner Moura vive salva-vidas idolatrado pelo irmão em filme de Karim Aïnouz.

Donato (Wagner Moura, centro) deixa tudo para trás para viver um grande amor com Konrad (Clemens Schick, esq) (Divulgação)

Duas motos cortam a areia das dunas cearenses, lutando para dominar o ambiente desértico. A música quase ensurdece o espectador. Segundos depois, a tela é tomada pela água – não tão agressiva quanto esperamos do palco de uma tragédia, mas traiçoeira. É ali, na Praia do Futuro, que Donato perde um homem pela primeira vez.

Wagner Moura é o protagonista, um bombeiro que sustenta a mãe e o irmão mais novo, Ayrton (Savio Ramos, na versão mais jovem), trabalhando como salva-vidas em Fortaleza. “E se eu fosse levado por essa água?”, pergunta, só para ouvir a resposta idolátrica: “Você é o Aquaman, você pertence à água! Mas se precisasse, eu iria te salvar”.

Donato se envolve com o amigo da vítima, o alemão Konrad (Clemens Schick), e vê a oportunidade para fugir de uma realidade que não lhe oferece mais certezas. Em Berlim, apaixona-se de vez (de um jeito meio romântico, meio frio) e deixa tudo para trás. (Apaixona-se por outro homem, sim, mas isso é apenas um detalhe.)

Anos depois, Ayrton (Jesuíta Barbosa) é só raiva e rebeldia, mas cruza o oceano sozinho porque sabe que é sua missão. Ele prometera ser o herói de Donato, quando as águas o levassem para longe da praia.

A ideia do herói é central no drama: de figuras como Aquaman, Speed Racer e Motoqueiro Fantasma à canção Heroes, de David Bowie, que emoldura o quadro final (uma partida, como em outros filmes do diretor Karim Aïnouz).

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Donato é frequentemente referenciado como o herói, inclusive num dos sub-títulos (são três: “O abraço do afogado”, “Um herói partido ao meio” e “Um fantasma que fala alemão”). Ele é um herói para os banhistas e para o irmão, mas não para si – na verdade, pouco vemos de heroico em suas ações, mais egoístas do que nobres. O que se vê, afinal, é que os três personagens se salvam mutuamente – Donato a Konrad, Konrad a Ayrton e Ayrton a Donato.

A relação entre Konrad e Donato espelha o abismo entre as culturas, entre o calor do Ceará e o frio úmido de Berlim. Os dois parecem distantes no diálogo, mas se entendem nos gestos mais simples. Uma curiosidade: Schick confessou que a barreira da língua dificultou sua expressão, o que transparece na tela (e torna tudo ainda mais verdadeiro).

Praia do Futuro tem passo lento e trilha sonora contida, mas carrega mensagens poderosas sobre medo, coragem e escolhas. O filme, no fim, é uma história de amor, mas com aquele jeito masculino de expressar (ou não) certos sentimentos – seja entre os amantes, seja entre os irmãos.

Assista se você:

  • Gosta dos filmes de Karim Aïnouz
  • Quer ver Wagner Moura num papel polêmico

Não assista se você:

  • Não gosta de filmes lentos ou com pouca ação
  • Não gostou dos outros filmes de Karim Aïnouz

Por Juliana Varella

Atualizado em 9 Mai 2014.