Nem tão masculino, nem tão branco: o Oscar 2018 foi, surpreendentemente, latino. Depois de uma temporada marcada por escândalos envolvendo acusações de assédio em Hollywood, carreiras destruídas e protestos em tapetes vermelhos, a cerimônia realizada no último domingo, 4 de março, trouxe um novo foco para as discussões em torno da diversidade no cinema de Hollywood: a presença de estrangeiros e, em especial, de nativos da língua espanhola, na identidade americana.
O grande vencedor da noite foi o romance com tom de fábula “A Forma da Água”, dirigido pelo mexicano Guillermo Del Toro. Essa é a quarta vez que um cineasta do seu país ganha o Oscar de Melhor Direção e apenas a segunda vez que leva a estatueta de Melhor Filme. Del Toro, agora, se junta à tríade formada por Alfonso Cuarón e Alejandro González Iñárritu numa fase bastante latina do Oscar, que vem se firmando desde “Gravidade” em 2013. “A melhor coisa que a indústria do cinema faz é apagar as marcas na areia quando o mundo tenta torná-las mais profundas”, discursou o diretor, ressaltando sua identidade enquanto imigrante.
Do México ao Chile
Mas Del Toro não foi o único a levar seu sotaque para o palco. O chileno “Uma Mulher Fantástica” também foi premiado como Melhor Filme Estrangeiro, desbancando concorrentes fortes como o russo “Sem Amor” e o sueco “The Square”. O longa ainda quebrou paradigmas ao se tornar o primeiro vencedor na categoria a ter uma protagonista trans – a atriz Daniela Vega, que, inclusive, foi a primeira pessoa trans a apresentar um candidato no Oscar. Ela introduziu a canção “Mystery of Love”, do filme “Me Chame Pelo Seu Nome”, também de temática LGBT.
Um terceiro latino a brilhar na noite do domingo foi a animação “Viva – A Vida é Uma Festa”, da Pixar, que é ambientada no México e tem como tema o Dia de los Muertos. O filme ganhou o Oscar de Melhor Animação, como previsto, mas também foi premiado na categoria Melhor Canção Original, com a bela “Remember Me”. Os demais prêmios seguiram sem grandes surpresas, distribuídos quase igualmente entre todos os favoritos: “Dunkirk” ficou com as categorias de edição e som, “Três Anúncios Para Um Crime” com as de atuação, “Me Chame Pelo Seu Nome” com o Roteiro Adaptado e “Corra!”, que já levara o prêmio do sindicato, repetiu a façanha com o Oscar de Melhor Roteiro Original.
Um Oscar consciente (mas nem tanto)
De forma geral, a cerimônia deste ano teve um tom mais sóbrio e politicamente correto do que as anteriores, abraçando abertamente todas as críticas que cercaram a Academia nos últimos anos, da gafe do Oscar 2017 até o movimento #TimesUp (pelo fim da disparidade salarial e de oportunidades entre homens e mulheres).
Esse último tema, inclusive, ganhou uma montagem completa celebrando a “mudança dos tempos” – entretanto, a mudança ficou apenas no discurso, já que nenhuma mulher foi premiada sozinha, exceto nas categorias específicas de atuação. Darla K. Anderson (Melhor Animação por “Viva – A Vida é Uma Festa”), Kristen Anderson-Lopez (Melhor Canção, também por “Viva – A Vida é Uma Festa”) e Rachel Shenton (Melhor Documentário em Curta-metragem por “The Silent Child”) todas dividiram seus prêmios com colegas homens.
Ao todo, “A Forma da Água” levou quatro Oscars, seguido por "Dunkirk", que levou três.