Cinema
Por Juliana Varella

Crítica: Em longa raso e cheio de preconceitos, Porta dos Fundos deixa para trás o sarcasmo inteligente que fez sua fama na internet

“Contrato Vitalício” chega aos cinemas no dia 30 de junho.

Gregório Duvivier interpreta um diretor de cinema que desaparece por dez anos (Divulgação)

Fico feliz que vocês não tenham votado naquele filme russo dos cegos viados. Aliás, aquele cego viado gordo e obeso era ótimo”. Minutos depois, outra tentativa de piada: “Não posso sair daqui sem comer, pelo menos, uma indicada a atriz coadjuvante”. Quase se podem ouvir as risadas gravadas ao fundo, como num programa de humor ruim em que é preciso avisar o público qual é o momento certo de achar graça. Mas não há graça.

Esse é o tipo de humor que o público verá em doses cavalares no primeiro longa-metragem do Porta dos Fundos, “Contrato Vitalício”, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 30 de junho. Um humor bem diferente do tipo de sátira inteligente que fez a fama do grupo – algo mais próximo de uma briga de crianças que, depois de esgotarem os argumentos, decidem ganhar a discussão xingando a mãe. Porque é mais fácil elevar a voz e disparar insultos do que colocar o cérebro para funcionar.

A história, que poderia compensar o tom errado das piadas, não ajuda em nada: um ator chamado Rodrigo (Fábio Porchat) e um diretor de cinema chamado Miguel (Gregório Duvivier) são premiados em Cannes. Durante a bebedeira de comemoração, assinam um contrato para trabalharem juntos em todos os seus filmes dali em diante.

Naquela noite, Miguel desaparece – sugado por alienígenas para o centro da Terra privada adentro. Dez anos depois, ele retorna e recruta Rodrigo para estrelar um filme sobre sua experiência fantástica, escalando prostitutas (todas travestis, porque preconceito não é problema para o grupo) e mendigos como seus assistentes e figurantes.

Esta é a história.

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Juro.

Quem assistiu ao trailer de “Contrato Vitalício” deve ter notado as referências de “Se Beber Não Case” e, de fato, o longa de 2009 parece ter sido uma fonte abundante de inspiração. O problema é que a versão do Porta exagera na dose: é como se todos os coadjuvantes fossem loucos como Alan (o personagem de Zach Galifianakis) e sua única função fosse irritar o protagonista – e, consequentemente, o pobre e, a essa altura, arrependido espectador.

O filme poderia abraçar sua vocação trash e não se levar tão a sério, como um Trapalhões nos velhos tempos, mas não o faz. Pretensioso, o roteiro tenta justificar 100 minutos de tortura psicológica com uma lição de moral muito pouco convincente (e com uma virada que, infelizmente, chega tarde demais).

Pode-se argumentar que o Porta dos Fundos explora uma comédia do absurdo, como um Monty Python em seu tempo, mas a comparação seria enormemente ambiciosa. O grupo britânico, apesar de também arranhar os limites do bom senso em filmes como “O Sentido da Vida”, trabalhava seus diálogos com muito mais sutileza e preferia mostrar a hipocrisia da sociedade nas ações dos personagens e nas situações impossíveis, não em frases gratuitamente ofensivas.

Ninguém esperava que “Contrato Vitalício” fosse politicamente correto, mas, pelo menos, esperava-se que fosse engraçado. O que se vê em tela, porém, é muito mais apelativo e muito menos interessante do que do que o grupo tem feito na internet desde sua criação e, em momento nenhum, consegue provocar um riso que não seja nervoso ou constrangido. As críticas, que vão desde a obsessão pelas redes sociais à inconveniência do repórter de fofocas, são rasas e repetitivas, as piadas não vão além do senso comum e o sofrimento expresso no rosto de Porchat, durante todo o filme, reflete o sentimento de todos nós: só queremos que tudo aquilo acabe logo.

Minha sugestão? Guarde seu dinheiro e vá assistir outra coisa.

Por Juliana Varella

Atualizado em 2 Jul 2016.