Tudo que você precisa saber sobre o filme "Coringa" (sem spoilers)

O filme, sem dúvidas, nos apresenta cenas que entrarão para a história do cinema e serão referência para o que vem pela frente. Embaladas por músicas de Frank Sinatra, The Smiths, David Bowie, Radiohead, Bee Gees, Beatles, Bob Dylan e tantos outros nomes incríveis, é impossível não ficar maravilhado com cenas onde Arthur Fleck dança e expõe seu psiquismo junto com cada passo.

É interessante observar que até certo ponto do filme as únicas cenas onde Arthur aparece feliz, seguro e quase lúcido são ao lado da mãe. Com ela, é possível vê-lo compreendendo seus sentimentos, vivendo algo legítimo e sendo otimista - bem diferente de como se apresenta em outras situações. Entretanto, apoiado em uma mãe que também tem uma frágil e confusa estrutura, a relação desanda e, assim como em "Réquiem Para Um Sonho" e "Psicose", vemos como a relação e intimidade entre mãe e filho pode ter resultados trágicos, com consequências irreversíveis.

Arthur Fleck, que sempre quis fazer rir, é na verdade o motivo de riso; e é angustiante assistir às muitas situações em que ele é agredido, humilhado e hostilizado, inclusive em todas as suas tentativas de interação. Da mesma forma, é sofrido ver como o sistema fracassa na fraca tentativa de cuidar de quem precisa de ajuda, assim como a saúde pública, que corta subitamente o pouco que fazia. E ainda que todas essas experiências não sejam a origem de sua loucura, elas indicam uma piora em sua condição. Entretanto, o longa tem uma linha muito tênue que pode deixar alguns expectadores confusos pelo fato de que em algumas cenas a sensação é que existe um senso de justiça e vingança.

Mas longe de ser uma autorização para que ele tenha se tornado um criminoso, o título é uma reflexão a respeito do que está por trás de uma condição e um exemplo de que ninguém é louco porque quer, se é louco porque é o que se pôde ser dentro de vivências que lhes foram possíveis.

Alguns elementos estéticos chamam a atenção durante todo o filme e são extremamente importantes para o andamento do personagem e ritmo do filme. A forma como ele usa a escada e a caixa de correio, como e quando as luzes piscam e as cores presentes conversam perfeitamente com os diálogos, roteiros e músicas. Quase como um balé, o longa é muito bem montado e tudo o que aparece em cena contribui para a compreensão de um sentimento ou alguma sensação vivida por ele.

É sempre impressionante ver a capacidade de um ator emprestar seu corpo despido de si mesmo para viver um personagem. E depois de nomes como Heath Legder, Jack Nicholson e Cesar Romero, o desafio de Joaquin Phoenix era ainda maior. Entretanto, ele deixa sua marca e dá a vida um Coringa único e majestoso.

Com uma caracterização impressionante, o ator está consideravelmente mais magro e abatido, e vestiu-se com uma risada sinistra, trejeitos, voz e feições perturbadoras - características que passam ao público toda sua loucura, confusão, sadismo, fragilidade e sarcasmo. O filme, inclusive, não conta com muitos outros atores fixos e Joaquin aparece em praticamente todas as cenas.